Canindeense narra disputa de territórios no Sertão: “Lideranças usam questão para aquecer oposição a Jr. Chagas”
Denisson Salustiano crítica disputa e diz que: "Infelizmente, muitas das lideranças políticas de Poço Redondo ignoram a situação do povo que vive na região disputada e usam a questão apenas como combustível para aquecer a oposição a Júnior Chagas"
*Denisson Salustiano é canindeense, escritor, doutor em Engenharia de Processos, co-fundador do Hub Xingó de Inovação e do Movimento Canindé+30
As últimas semanas foram movimentadas no último trecho da Rota do Sertão. Inconformidade em Poço Redondo e satisfação em Canindé de São Francisco. No dia 8 de fevereiro, os desembargadores da segunda turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região – TRF5 negaram provimento às apelações feitas pelo município poço-redondense para que mudasse uma decisão feita pelo mesmo tribunal favorável a Canindé.
Infelizmente, muitas das lideranças políticas de Poço Redondo ignoram a situação do povo que vive na região disputada e usam a questão apenas como combustível para aquecer a oposição a Júnior Chagas e seu grupo. Uma disputa que já durava mais de vinte anos e começou por razões que precisam ser relembradas. Nos tempos em que a Fazenda Cuiabá era propriedade da família Britto e o Coronel Antônio Caixeiro, de Canhoba, mantinha a Fazenda Alto Bonito, nem se imaginava que a região um dia seria tão disputada. A criação dos dois municípios, através da Lei Estadual 554 de 1954, definiu os limites territoriais daquelas terras, incluindo a fazenda do canhobense a Canindé.
Quando o acampamento do MST ocupou o Alto Bonito, a maior proximidade de algumas lideranças políticas de Poço Redondo com os líderes do acampamento criou a ilusão de que a área poderia ser incorporada ao município, com as vantagens eleitorais que isso traz. Isso gerou a cena épica da derrubada da placa que dizia onde acabava um município e começava outro, a mando do prefeito Frei Enoque, aliado de Roberto do MST. Placa que havia sido colocada pelo prefeito Galindo na intenção de garantir a defesa do território canindeense, como mandava a Lei.
A falta da placa não gerou problema, pois apesar de os líderes dizerem que ali era Poço Redondo, o povo já assentado vivia em Canindé e reconhecia-se como canindeense. Isso é o que mostram os autos. O processo, movido pelo município canindeense contra o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e o município de Poço, pede a correção dos mapas estatísticos municipais feitos pelo IBGE em 2007 e 2013. Esses mapas ignoraram os marcos geográficos que delimitam os municípios em Lei.
Usando a desculpa da tecnologia, o instituto mudou deliberadamente a interpretação dos marcos, dizendo que Poço Redondo ia até o fundo da sede da Fazenda Cuiabá dos Brittos. Mas a Lei já dizia que o limite é no fundo da Fazenda, demarcado por uma estrada. E a Justiça fez valer a Lei, soberana. Mais soberana ainda é a vontade do povo, consultado pela Justiça através de questionários feitos por perícia técnica. E o povo, novamente, declarou: são canindeenses, pois fazem tudo em Canindé.
Como dito, o assunto é combustível para disputa eleitoral poço-redondense que se aproxima. Enquanto isso, os 9 mil cidadãos canindeenses, disputados na Justiça, muitos deles moradores do maior assentamento de reforma agrária da América Latina, precisam buscar em Canindé a ajuda política necessária quando alguma bomba quebra no perímetro irrigado Jacaré-Curituba. Os produtores de lote sequeiro os produtores recebem só UMA carrada d’água no mês, como acontece na comunidade Maria Feitosa. O posto de saúde do Canadá continua fechado. E tantos outros exemplos.
Historicamente é incontestável a ligação cultural entre Poço Redondo e os palcos do cangaço, nas Fazendas Angicos e Maranduba. Ainda que a grota onde mataram o bando de Lampião sempre estivesse geograficamente localizada em Canindé, segundo o próprio IBGE, o município nunca a contestou culturalmente. Mas o homem, a terra e a luta falam por si, e na área devolvida pela Justiça eles falam em Canindé.
A tragédia de Santa Rosa do Ermírio fez do Frei um político. Não façamos do desenvolvimento os municípios coirmãos, por disputa política, mais uma tragédia.
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