OS SONS DA MADRUGADA
Já ouviu algo estranho de madrugada na rua?
Dizem os mais idosos que todos temos medo de alguma coisa, nem que seja ter medo de ter medo. Confuso? Um pouco. Sou uma pessoa que aprendi a não temer o que posso explicar e o que não posso decifrar invento uma tese e em segundos o tremor se esvai e continuo a fazer o que estava programado. Por exemplo, você está trabalhando de madrugada e começa a ouvir passos dentro de casa. A não ser que haja por perto uma “alma penada” ou o ladrão tenha atravessado paredes, só pode ser uma goteira na torneira da pia. Bem, meu cérebro diz isso e sabe lá o que era.
Na minha cidade, Itabaiana, a madrugada começa às 18h quando as portas do comércio se fecham. A cidade morre. Os estudantes trancafiados nas escolas, as pessoas em suas “cadeias particulares” com medo de sentar na calçada para fofocar e algumas motos correndo para lá e para cá sendo sorteadas no jogo da morte entre o “chegar em casa em paz” e “ser assaltado”. Muitas vezes essas motos levam bandidos que de vez em quando eles mesmos são assaltados e seu opressor tendo cem anos de perdão. O silêncio entra nas casas que contrasta com alguns televisores ligados nas novelas, outras casas cada um em seu aposento no silêncio de uma necrópole cada um com seu celular a conversar com pessoas imaginárias. O silêncio transborda as sensações. Eu sou fã do silêncio absoluto, aquele que dá para ouvir até a batida do coração de um mosquito que voa perto de sua cabeça. É nesse momento que as coisas começam a dar errado.
Os filmes de terror adoram falar da meia-noite, mas não é este horário que amedronta, mas as 3h da manhã. Em tese a 0h é o período que está mais escuro, já que o sol está exatamente no lado oposto a qualquer ponto entre os trópicos, caso esteja nele. Mas, segundo as profecias, o horário macabro são as 3h da madruga, o período em que os demônios zombam dos humanos, pois Jesus Cristo teria sido assassinado exatamente às 3h da tarde. Bizarro, não acham? Bem, eu não acreditava nisso, mas algo interessante aconteceu recentemente e mudou minha concepção, em partes.
Acordei por volta das 2h da madrugada, ou melhor, nem havia dormido ainda pois estava cochilando no sofá entre um sonho e outro. Levantei, fui ao banheiro, olhei as mensagens no celular e voltei para o sofá para ver onde havia parado no filme (que não era de terror). Deitei e quase uma hora depois começo a ouvir a Nona Sinfonia Canina na minha rua. Queridos leitores, quem de vocês nunca acordou em plena madrugada com barulho de cães raivosos se pegando na rua por causa de uma cachorra? Fui até a caixa do correio, levantei e meti o rosto. Estava vendo a matilha a uns trinta metros. Contei oito cachorros e uma cadela, era uma cena bizarra os bichinhos se revezando na bichinha magrela e que deitava a cada instante. Tirei a vista um instante e olhei o celular, nele marcava exatamente 3h, coloquei-o no bolso e voltei a vista na caixa do correio. Amigos, peço licença para dizer que o que aconteceu foi de verdade, acreditem em mim. Do outro lado, na calçada, havia alguém ou algo olhando de fora para dentro através da mesma caixa de correio. Estava escuro, mas dava para ver os olhos. Eu, naturalmente dei um passo para trás sem fechar a caixa e disse “opa, quem é?” e nada de responder. Corri para dentro de casa e fui para a câmera tentar ver se a pessoa estava visível. Nada acontecia, só os cães que ainda estavam no local. Retrocedi a imagem para ver quem era e nada, nada estava exatamente às 3h estava do lado de fora da minha casa, nem dez minutos antes nem dez depois.
Guardei esta história por alguns meses, não sabia a reação das pessoas ao lerem o acontecido, mas toda vez que ouço cães fazendo seu bacanal na minha rua eu nem me levanto, vai que o “Homem da caixa do Correio” esteja me esperando para olhar em silêncio através do muro e ver que eu também sou um pouco daquele que me olha. Não sei se foi real, nem ao menos sei se alguém já passou por algo similar, mas sei que tive medo e desse medo não sofrerei mais.
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