O Largo da Gente Sergipana: entre a valorização da cultura e da síndrome da mentalidade colonizada
“Já vem do ciclo do açúcar Fizemos cópias mal feitas”.
O Governo do Estado finaliza uma obra que em seus dizeres “é um reforço à sergipanidade”. Louvável e necessário em um período classificado pelo sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman como Modernidade Líquida (não confundir com pós-modernidade). Aliás, sobre o escopo teórico que embasou o conceito cultural da obra os idealizadores foram buscar nas manifestações folclóricas sergipanas Bacamarteiros, São Gonçalo, Chegança, Bumba meu boi, Parafusos, Cacumbi, Taieira e Lambe Sujo e Caboclinhos os elementos identitários que unifica a diversidade dos sergipanos. Todas elas classificadas como folguedos, que são rituais populares, simbólico e abarcam atividades corporais com o uso de fantasias, muita música e dança. Neste quesito o Governo poderia receber 10. Nota 10.
Mas aí vem algumas contradições que até poderiam passar desapercebidas, mas que refletem como continuamos colonizados pela mentalidade eurocêntrica e pela necessidade da legitimação da cultura do velho mundo.
O texto informativo da Secretaria de Infraestrutra do Estado explica que “a concepção busca referências em monumentos como o Big Ben (Londes), a Torre Eiffel (Paris), a Estátua da Liberdade (Nova York) e o Cristo Redentor (Rio de Janeiro), além dos Orixás (Salvador)”. Exceto o caso soteropolitano, quais elementos foram tomados dos monumentos, como a Torre Elizabeth, localizado em Londres e que homenageia à Rainha Elizabeth II, comumente conhecida como Big Ben? E da estátua novaiorquina presente dos franceses cujo nome oficial é La liberté éclairant le monde (para a turma intelectual que adora fazer biquinho), o que foi absorvido?
Se as referências foram meramente plásticas e arquitetônicas, vá lá. Mas há um quê de incoerência ontológica nestas fontes.
Britânicos, franceses e ingleses sem barbatanas foram responsáveis ao longo da História por massacres de populações, escravização, apropriação econômica, politica e cultural.
Do contrário desta lógica, as manifestações populares se construíram a partir da resistência. Mesmo com a “folclorização” mercantilizadora de muitos, estas culturas sobrevivem para demarcar identidades que mesmo com ferro e fogo superaram a lógica da dominação e colonização.
Isto nossos artistas responsáveis pela obra não percebeu.
Parecem desconhecer, por exemplo os conceitos elaborados no campo dos Estudos Culturais que teve como expoente o anglo-jamaicano Stuart Hall. De forma didática e precisa, Hall nos faz ver através de conceitos como hegemonia e cultura. Nada que o texto simples como este consiga dar conta.
Mas desta obra importante para a preservação da memória e identidade de milhares der sergipanos fica a impressão que continuamos colonizados culturalmente.
P.S. Não vamos polemizar a ausência do vaqueiro entre os monumentos. Porque esta é uma outra história.
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