Presidente do Sintese avalia desafios em 2024: “O cenário continua tão grave quanto no governo Belivaldo”


05/03/2024 20:40

Em entrevista ao Política de Fato, o presidente do Sintese, Roberto Silva, demonstrou pessimismo com a política de educação do Governo Fábio Mitidieri e avalia cenários de luta para 2024 do sindicato que representa a categoria dos trabalhadores da educação no Estado de Sergipe e avaliou os desafios e possibilidades para a luta dos trabalhadores da educação neste ano, “no campo da política educacional, o cenário continua tão grave quanto nós vínhamos vivendo no governo Belivaldo”, disse.

Entre outros pontos destacados na sabatina, Roberto faz críticas ao programa “Escola Nota 10” e emite duras críticas à relação Assembleia Legislativa x Governo do Estado, “Temos hoje uma Assembleia muito governista. A grande maioria dos deputados está do lado do Governo e o Governo tem 19 ou 20 deputados que votam integralmente nos seus projetos independente da gravidade e do impacto deles para a educação e para a sociedade sergipana. Então mesmo com todos os argumentos, com toda a discussão do prejuízo que vai se trazer para a sociedade e para a educação, os projetos são votados e aprovados”.

Vale a pena conferir a entrevista completa e entender como pensa o dirigente de um dos principais sindicatos de Sergipe neste sequência de seis perguntas que possibilitam descrever um pouco do que podemos esperar da entidade em 2024.

1ª pergunta – Qual o balanço feito pelo Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Sergipe das lutas desenvolvidas em 2023?

Roberto Silva: 2023 foi um ano de muita luta, tanto na rede estadual quanto nas redes municipais e nacionais das quais o Sintese participou. Nós começamos o ano com o movimento da FAMES (Federação das Administrações Municipais do Estado de Sergipe) orientando os municípios a não atualizar o piso, mas foi a luta dos professores que fez com que a mais de 90% dos municípios fizesse esse processo de atualização que a gente entende como muito importante.

Evidentemente que os municípios que não atualizaram não mudam a luta pela atualização do piso em 2024. Então a gente compreende como crucial a organização dos professores nos municípios para essa luta por valorização, por respeito e por gestão democrática, que é uma outra luta que está em curso do SINTESE.

Na rede estadual nós tivemos a luta pelo início da retomada da carreira compreendendo-a como uma luta extremamente importante, já que nós tivemos a carreira destruída em 2022 pelo governador Belivaldo e construímos uma carta compromisso aos candidatos a governador de Sergipe em 2022 e um dos pontos cruciais é justamente essa retomada da carreira.

O anúncio do governador Fábio de que os servidores públicos só teriam 2,5%, os professores não se contentaram com esse anúncio e mantiveram a luta pelo início da retomada da carreira que nós conseguimos, mas entendemos que, agora em 2024, outras lutas serão necessárias para continuar esse processo e temos certeza de que a luta dos professores será vitoriosa este ano.

 

2ª pergunta – E de que maneira o sindicato, especialmente a diretoria, da qual o sr. é presidente, avaliou o primeiro ano de gestão do governador Fábio Mitidieri?

Roberto Silva: A avaliação que a gente faz do governo Fábio Mitidieri é a de que nós começamos o ano com o processo de negociação da retomada da carreira, fomos surpreendidos com o anúncio unilateral do governador de que seriam pagos apenas 2,5% e “pronto” e foi a luta do SINTESE que fez o governo recuar e constituir uma comissão para o início da retomada da carreira.

A gente entende que o governo poderia avançar mais nesse processo ainda em 2023, mas a proposta que foi apresentada para 2024 foi importante, mesmo sendo um processo ainda pequeno. Mas a gente também entende que, no campo da política educacional, o cenário continua tão grave quanto nós vínhamos vivendo no governo Belivaldo.

Há um processo avassalador de entrega da gestão pedagógica da SEDUC às fundações privadas, vide o acordo de cooperação do Governo de Sergipe com a Fundação Itaú, onde o governo entrega toda a gestão do ensino profissionalizante e integralmente à Fundação Itaú ou seja a secretaria se desresponsabiliza da gestão do ensino para entregar à iniciativa privada, o que levará forte impacto negativo na formação dos estudantes, porque teremos um processo totalmente desvirtuado do papel, tanto da formação humana quanto do exercício da cidadania. Esse processo ele acaba sendo totalmente negligenciado, o que compreendemos que é muito grave.

O outro problema é o Programa Educação Nota Dez, que foi instituído pelo Governo do Estado e que tem o objetivo nítido de criminalização dos professores e das escolas de Sergipe, já que a ideia do programa é premiar alguns e excluir a maioria das escolas e professores para jogar a sociedade contra os professores. Essa é uma lógica das fundações de educação privadas, que é a de bonificação de alguns e exclusão da maioria, assim como ocorre em algumas empresas privadas com o funcionário do mês em meio a outros 200. É uma política nociva, que nega a formação e o processo de trabalho e formação dos professores.

O resultado que a gente tem visto é exatamente o contrário da política que o Governo de Sergipe tenta construir, vide o resultado das aprovações dos estudantes de escola pública no ENEM. Um alto número de aprovados que é fruto do trabalho do magistério no nosso estado.

 

3ª pergunta – O que esperar de 2024 em termos de combatividade por parte do Sintese, não só nas pautas corporativas, mas na luta por uma educação justa para todos e todas? 

Roberto Silva: O Sintese tem, além da pauta salarial que é a pauta importante para o magistério sergipano e para o trabalhador e trabalhadora, até porque nós defendemos a remuneração para a sobrevivência nossa e da nossa família, a pauta da educação de qualidade social.

Nós entendemos que a pauta da alimentação escolar de qualidade está na ordem do dia. Inclusive nós estamos cobrando dos órgãos competentes o respeito por parte do Governo do Estado e dos municípios sergipanos que, no mínimo, aplique 30% dos recursos da alimentação escolar na agricultura familiar. Sergipe é um dos estados, tanto a rede estadual como as redes municipais, que não cumprem essa norma nacional.

Nós também estamos numa luta pela garantia da matrícula, tendo em vista que Sergipe é um dos estados do Nordeste, na verdade o único estado do Nordeste, que não recebe complementação da União em função da baixa matrícula que o estado garante às crianças, adolescentes, jovens e adultos em função da inexistência de uma política séria de matrícula, de chamada pública, de busca ativa dos estudantes e das nossas escolas.

Então há, na verdade, uma negligência por parte dos gestores e que a gente entende que os órgãos de controle têm um papel muito importante para que a gente possa avançar nessa questão do direito à educação. Os dados do Censo Populacional do IBGE têm demonstrado exatamente esse caos educacional que a gente vive no Estado de Sergipe, onde um número gigantesco de jovens, adultos e adolescentes estão fora das escolas por negligência das políticas públicas que negligenciam essa questão.

Essas são pautas que compreendemos como extremamente importantes para os nossos estudantes garantirem o direito à educação que entendemos ter sido negligenciado. Temos visto essas políticas, como do Educação Nota 10, que tentam construir uma cortina de fumaça para tentar convencer a sociedade de que há uma educação de qualidade, quando na verdade existe um descaso com o direito à educação. Por exemplo, a Rede Estadual de Sergipe em 2023 teve 165 mil matrículas e em 2024 nós temos verificado algo em torno de 140 mil matrículas de estudantes. Uma redução dessa magnitude é inaceitável, é inexplicável a não ser pela negligência de uma política de busca ativa séria.

 

4ª pergunta – Como tem sido a relação do Sintese com a Assembleia Legislativa do Estado de Sergipe nesse início da legislatura 2023-2026? Há deputados que recebem com boa vontade a pauta dos trabalhadores do magistério? Há deputados que evitam recebê-los?

Roberto Silva: Temos hoje uma Assembleia muito governista. A grande maioria dos deputados está do lado do Governo e o Governo tem 19 ou 20 deputados que votam integralmente nos seus projetos independente da gravidade e do impacto deles para a educação e para a sociedade sergipana. Então mesmo com todos os argumentos, com toda a discussão do prejuízo que vai se trazer para a sociedade e para a educação, os projetos são votados e aprovados.

Um exemplo é o projeto que alterou a forma de adesão das escolas da Rede Estadual ao Ensino Integral que, pela lei anterior tinha que passar por uma decisão da escola, porque a escola é quem sabe qual é a realidade da sua comunidade, e simplesmente o governador Fábio Mitidieri mandou um projeto para a ALESE tirando desta escola e dando ao próprio governador o poder de decisão, ou seja, isso é muito grave. É um retrocesso democrático e é apenas um dos exemplos da dos absurdos que foram aprovados em 2023 pela Assembleia Legislativa mesmo com os alertas, mesmo a gente pedindo que não votem, que se abra um debate com o Governo do Estado, mas tem sido votado.

Então a gente tem tido uma Assembleia extremamente governista, o que a gente entende que é ruim, já que não há um equilíbrio entre situação e oposição, os deputados não têm autonomia para questionar e para cobrar até mesmo explicações ao governo, tendo que votar de qualquer jeito, sendo que o governo não se dá nem o direito de explicar aos deputados sobre o projeto e sobre o impacto daqueles projetos.

É muito grave a situação, mas foi o que o povo sergipano elegeu, né? É preciso e a gente entende que a Assembleia Legislativa é um exemplo que precisamos para entender a importância Legislativo para a sociedade e para a classe trabalhadora. Porque, às vezes, as pessoas votam no representante do Poder Executivo de forma mais consciente, a partir do trabalho que o político produziu e em relação ao Poder Legislativo acaba não tendo muito esse critérios, gerando esses problemas que entendemos como muito graves.

 

5ª pergunta – Muito tem se falado sobre a situação dos aposentados em Sergipe, especialmente da Educação. Qual é a real situação do Sergipe Previdência hoje? Por que existe a afirmativa do Sintese de que a terceirização destrói o sistema previdenciário dos servidores do estado? 

Roberto Silva: É simples: O Governo do Estado, com uma política que vem desde o governo de Jackson Barreto e Belivaldo e agora Fábio, vem adotando uma política de atribuir a inexistência ou a dificuldade de concessão de aumento e reajuste salarial dos servidores à necessidade de também assegurar esses aumentos aos aposentados, colocando como um problema o déficit previdenciário.

O Sintese solicitou um estudo ao DIEESE e esse estudo, inclusive, já fizemos discussões com o governo em vez de negociação e nós identificamos muitos problemas, tipo o déficit que o governo diz existir não é do tamanho que o próprio governo diz para a sociedade que é, com base nos próprios relatórios do Governo do Estado.

Segundo é que existe um problema crônico em Sergipe o qual é necessário ser enfrentado, que é o problema das terceirizações e dos contratos temporários. O Governo do Estado está substituindo os servidores concursados que contribuem para previdência estadual para os servidores terceirizados e contratos temporários que contribuem para o INSS. Então isso acaba gerando déficit.

Se não houver a política de concurso público em todas as secretarias, substituindo os contratos, os cargos comissionados por indicação política, os terceirizados, que são uma forma disfarçada de indicação política que foi criada em Sergipe e no Brasil, nós vamos ter um problema cada dia maior. Por exemplo, a pesquisa feita pelo DIESSE com dados do próprio governo mostra que em 2003 tinha 42 mil servidores ativos e em 2022 passou a ter 23 mil servidores ativos. Essa redução tem impacto na previdência.

Esse déficit que o governo tenta jogar como culpa dos aposentados é culpa do próprio governo, que faz uma política de descapitalização do fundo previdenciário do estado.

A outra questão que precisa ser enfrentada é o que a Constituição Federal chama de Fundo de Aprovisionamento, no qual o estado coloca recursos próprios mensalmente e aprovado em Lei, para garantir o pagamento das pensões e aposentadorias futuras. Sergipe é um dos poucos estados do Brasil que não criou esse fundo. Existe uma negligência por parte do governo para continuar jogando a culpa nos aposentados.

Também há o debate de participação dos servidores no Fundo de Previdência, que nós não temos assento. Vamos debater isso em 2024, já que ainda não temos essa política, e, além disso, os aposentados e aposentadas têm a necessidade de construir uma luta unificada das mais diversas categorias e secretarias para constituir uma luta pela devolução dos 14% confiscados pelo governador Belivaldo. Foi uma injustiça cometida pelo governo e que precisa ser reavida o mais breve possível.

 

6ª pergunta – Qual a mensagem que o Sintese deixa para as professoras e professores filiados em todo o Estado de Sergipe em relação à atuação em 2024?

Roberto Silva: A mensagem que a gente deixa aos professores e professoras é a de que nós vamos ter, no dia 06 de março, uma Assembleia Geral Unificada e que, essa assembleia, é muito importante.

Será a primeira assembleia do ano e nela, tanto professores da rede estadual quanto professores das redes municipais ativos e aposentados, construirão a luta por valorização, pela garantia do piso na carreira e pela construção do Março Vermelho. No nosso congresso estadual do SINTESE, que aconteceu em 2023, nós aprovamos a realização anual do Março Vermelho, cuja ideia é a de que essas pautas de luta dos professores das redes municipais, dos professores da rede estadual, ativos e aposentados, estejam unificados em um grande março de luta.

A gente convoca todos e todas para essa assembleia no 6 de março, às 9h no Cotinguiba Esporte Clube Aracaju, para que a gente possa construir um março com muitas lutas e, com certeza, com muitas vitórias.


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